A anemia (ou doença) falciforme é um distúrbio hereditário em que a hemoglobina A, predominante nas hemácias de adultos, é substituída pela hemoglobina S, produto de uma mutação do gene que codifica as cadeias peptídicas beta da hemoglobina A. No feto, a hemoglobina F é predominante, e é substituída após o nascimento pela hemoglobina A. São conhecidas muitas variantes que resultam de mutações do gene da cadeia beta da hemoglobina A, mas apenas algumas são comuns, como as hemoglobinas S, C, D e E. Outro distúrbio genético relacionado é a beta talassemia, em que há redução de velocidade de produção das cadeias beta. O gene da anemia falciforme é encontrado em descendentes de africanos e de algumas populações do Mediterrâneo.
Pessoas com um gene normal da hemoglobina A e um gene da hemoglobina S (heterozigotos) produzem de 20% a 40% de hemoglobina S e uma quantidade maior de hemoglobina A. Essa combinação, chamada traço falcêmico, não causa problemas de saúde, mas pode transmitir o gene anormal para os filhos. Pessoas com duas cópias do gene da hemoglobina S (homozigotos) não produzem hemoglobina A; quase toda a hemoglobina produzida é a S, causando a anemia falciforme. Outras pessoas podem herdar um gene da hemoglobina S e outro de outra variante da hemoglobina (duplos heterozigotos, SC, SD etc.), apresentando sintomas da anemia falciforme abrandados. A herança combinada da hemoglobina S e da talassemia beta causa quadros clínicos variados, desde doença indistinguível da anemia falciforme até sintomas leves.
A hemoglobina S é menos solúvel que a hemoglobina A, formando polímeros em ambientes com pouco oxigênio. Esses polímeros mudam a forma da hemácia de disco bicôncavo para o aspecto característico de foice. Parte das hemácias afoiçadas voltam ao normal nos pulmões, mas em uma fração o afoiçamento é irreversível. As hemácias afoiçadas causam obstrução de arteríolas e capilares, provocando microinfartos e destruição local de hemácias.
A vida média das hemácias na anemia falciforme é de 10 a 20 dias, em vez dos 120 dias das hemácias normais. A medula óssea aumenta a produção de hemácias para compensar em parte a destruição, e libera hemácias imaturas na circulação. Como essa compensação é insuficiente, os pacientes apresentam anemia.
Sinais e sintomas
Recém-nascidos com anemia falciforme não apresentam a anemia. A doença se desenvolve com a substituição da hemoglobina F pela hemoglobina S.
Sintomas e complicações da anemia falciforme incluem:
- A Anemia é resultado da diminuição da vida média das hemácias. Causa fadiga, pouca resistência física, tonteiras, palidez, falta de ar e taquicardia. Crianças anêmicas podem mostrar retardo de crescimento. Nas crises aplásticas há uma interrupção da produção de hemácias, com piora da anemia e necessidade de transfusões de sangue. Com frequência estão associadas a uma infecção por parvovírus B19.
- Crises dolorosas são uma complicação frequente. Estão associadas à obstrução de arteríolas e capilares, com lesão dos tecidos locais. A dor ocorre principalmente nos ossos, nas articulações, no tórax e no abdome. Em crianças pequenas são frequentes dor e edema das mãos e dos pés. Falta de oxigênio, infecções, desidratação, mudanças de altitude e extremos de temperatura podem desencadear as crises, mas elas também podem ocorrer sem nenhuma causa aparente. Os sintomas em geral desaparecem em alguns dias.
- Crianças com anemia falciforme podem ter infecções bacterianas graves, principalmente por pneumococos. Pneumonias são uma causa importante de morte em crianças falcêmicas.
- Outra complicação é síndrome torácica aguda, com tosse, dor torácica, febre e insuficiência respiratória. Também é uma causa importante de morte em crianças com anemia falciforme.
- Acidentes vasculares cerebrais podem causar lesões e incapacidades permanentes. São mais comuns em crianças do que em adultos, ocorrendo em 10% das crianças falcêmicas.
- Sequestração esplênica é outro tipo de crise em que um acúmulo de hemácias causa aumento rápido do baço, provocando dor abdominal, diminuição da pressão arterial e choque. Pode ser necessário uma cirurgia para retirar o baço a fim de controlar a crise.
Outras complicações incluem cálculos biliares, necrose óssea, insuficiência renal, úlceras nas pernas, alterações da retina e ereção prolongada (priapismo).