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Este artigo foi modificado pela última vez em 28 de Dezembro de 2019.
Resumo

Talassemias são um grupo de distúrbios que afetam a produção de hemoglobina, a proteína transportadora de oxigênio encontrada nas hemácias. A molécula de hemoglobina tem duas partes: o heme, um complexo contendo ferro, e a globina, formada por quatro cadeias proteicas, cada uma circundando um heme. Essas cadeias definem tipos de hemoglobinas com estruturas e funções diferentes. Os principais tipos normais de hemoglobina são:

  • Hemoglobina A - Compreende de 95% a 98% da hemoglobina em adultos. É formada por duas cadeias alfa (α) e duas cadeias beta (ß).
  • Hemoglobina A2 - De 2% a 3,5% da hemoglobina de adultos. Contém duas cadeias alfa (α) e duas cadeias delta (δ).
  • Hemoglobina F - Até 2% da hemoglobina de adultos. Tem duas cadeias alfa (α) e duas cadeias gama (γ). É a principal hemoglobina produzida durante a gestação. É quase toda substituída pela hemoglobina A após o nascimento.

Mutações nos genes que codificam as cadeias da globina causam distúrbios da produção de hemoglobina. Há quatro genes que codificam a cadeia alfa e dois que codificam a cadeia beta. (Para mais informações sobre testes genéticos (leia O universo dos testes genéticos). Os distúrbios hereditários causados por mutações desses genes são classificados em dois grupos:

  • Talassemias, em que há diminuição da velocidade de síntese de uma das cadeias da hemoglobina (discutidas neste artigo)
  • Hemoglobinas anormais, em que há substituição de um aminoácido em uma cadeia da globina (leia Variantes da hemoglobina)

Nas talassemias, a diminuição da produção de um tipo de cadeia perturba o equilíbrio entre as cadeias e permite combinações anormais entre elas ou aumento relativo de componentes menores da hemoglobina, como as hemoglobinas A2 e F.

A principal classificação das talassemias é pelo tipo de cadeia da globina afetada.

Classificação das talassemias

A talassemia alfa ocorre por  falta (deleção) ou mutação de um ou mais dos quatro genes que codificam a cadeia alfa da globina. O quadro clínico varia com o número de genes afetados:

  • Portador silencioso (um gene afetado). Não apresenta anemia nem alteração do VGM, mas pode transmitir o gene afetado para os filhos. Com frequência é identificado apenas quando um filho apresenta uma forma de talassemia mais grave, por ter herdado genes anormais da mãe e do pai. Portador assintomático só pode ser diagnosticado com análise do DNA.
  • Traço talassêmico alfa (dois genes afetados). Os pacientes apresentam hemácias microcíticas, hipocrômicas, VGM baixo e anemia discreta. O diagnóstico em geral é feito por exclusão de outras causas de anemia microcítica, em especial por carência de ferro, e pode ser confirmado por análise do DNA.
  • Doença da hemoglobina H (três genes afetados). A grande diminuição da síntese de cadeias alfa causa a formação de tetrâmeros (grupos de quatro) da cadeia beta, chamados hemoglobina H. O quadro clínico é muito variável, desde anemia discreta assintomática até anemia grave com esplenomegalia (aumento do baço).
  • Talassemia alfa maior (quatro genes afetados). Não há produção de cadeias alfa. A hemoglobina do feto é formada por tetrâmeros de cadeias gama (hemoglobina de Bart), o que causa anemia grave e hidropsia. A maioria das gestantes tem toxemia e pode apresentar sangramentos graves após o parto. Os fetos morrem no útero ou logo após o nascimento.

A talassemia alfa é encontrada com maior frequência em descendentes de pessoas do sudeste asiático, da Índia, do oriente próximo e do Mediterrâneo.

A talassemia beta é provocada por mutações de um ou dos dois genes que codificam a cadeia beta. Foram identificadas quase 200 mutações, mas apenas cerca de 20 são comuns. A gravidade da anemia depende das mutações presentes e do grau de diminuição da produção de cadeias beta. Quando esta produção está diminuída, a doença é chamada talassemia beta+; quando está completamente eliminada, é chamada de talassemia beta0. Em todos os casos, a doença só se manifesta a partir do primeiro ano de vida, quando a hemoglobina fetal (α2γ2) é substituída pela hemoglobina A (α2ß2).

A talassemia beta é subdividida em:

  • Traço talassêmico beta (um gene talassêmico e outro normal). Os pacientes têm microcitose e podem apresentar anemia branda, sem grandes consequências clínicas.
  • Talassemia beta intermediária (dois genes alterados, mas mantendo níveis variados de produção de cadeias beta). A gravidade da anemia depende das mutações presentes, variando desde anemia branda até quadros semelhantes à talassemia maior. Os pacientes podem precisar de transfusões ocasionais.
  • Talassemia beta maior ou anemia de Cooley (dois genes alterados, com grande diminuição ou completa ausência da produção de cadeias beta). Anemia grave a partir dos primeiros meses de vida, exigindo transfusões de sangue regulares durante toda a vida. As transfusões frequentes provocam acúmulo de ferro no organismo, que, se não tratado, causa insuficiência de órgãos e morte prematura.

Ocorrem também combinações de genes da talassemia beta com genes de variantes da hemoglobina. As mais comuns são:

  • Hemoglobina E – Talassemia beta. A hemoglobina E é uma variante comum no sudeste asiático. A combinação com talassemia beta causa uma anemia de gravidade moderada, semelhante à talassemia beta intermediária.
  • Hemoglobina S – Talassemia beta. A hemoglobina S é a variante mais comum no mundo, especialmente em descendentes de pessoas da África e do Mediterrâneo. A gravidade da combinação com a talassemia beta depende da quantidade de cadeias beta produzidas. Se a produção dessas cadeias for muito diminuída, o quadro clínico é igual ao da anemia falciforme.  
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Sobre Talassemias
  • Exames

    Hemograma. Mostra a intensidade da anemia, se estiver presente. Um VGM baixo pode ser a única indicação do traço talassêmico, após a exclusão de carência de ferro. O exame do esfregaço de sangue mostra hemácias microcíticas, podendo haver hipocromia, variações de tamanho (anisocitose) e de forma (poiquilocitose), e hemácias nucleadas.

    Exames do ferro. Incluem ferro sérico, ferritina, capacidade de transporte de ferro e saturação da transferrina. Avaliam diferentes aspectos do armazenamento e do uso do ferro no corpo. São importantes para avaliação da sobrecarga de ferro em pacientes com talassemia que recebem múltiplas transfusões de sangue.

    Pesquisa de hemoglobinopatias. Diversos exames que determinam a percentagem das diferentes hemoglobinas e pesquisam variantes da hemoglobina. Nas talassemias beta, pode haver aumento relativo das hemoglobinas A2 e F. A hemoglobina H pode ser encontrada nas talassemias alfa.

    Análise do DNA. Exames usados para investigar deleções ou mutações dos genes das cadeias alfa e beta da globina.

  • Tratamento

    Pessoas com traço talassêmico não precisam de tratamento. Entretanto, podem fazer aconselhamento genético, porque transmitem os genes talassêmicos para os filhos.

    Pacientes com hemoglobina H ou talassemia beta intermediária apresentam graus variáveis de anemia. Têm uma vida relativamente normal, mas precisam de acompanhamento médico e pode ser necessário fazer transfusões de sangue ocasionais. Alguns têm maior necessidade de ácido fólico e precisam usar suplementos dessa vitamina.

    Pacientes com talassemia beta maior precisam de transfusões a cada três a quatro semanas durante toda a vida, para manter níveis adequados de hemoglobina e para evitar anormalidades de crescimento e de órgãos. As transfusões de sangue frequentes causam acúmulo de ferro no fígado, no coração e em outros órgãos, que é combatido usando tratamento com quelantes, que se ligam ao ferro e provocam sua eliminação do corpo pela urina. Em alguns casos, é necessária a remoção cirúrgica do baço (esplenectomia).

    O transplante de medula óssea foi usado para tratar alguns casos de talassemia beta maior.

    Fetos com talassemia alfa maior morrem no útero ou logo após o nascimento. O tratamento tem o objetivo de interromper a gravidez ou monitorar a mãe para evitar complicações. Em alguns casos, tratamentos experimentais, como transfusões ou transplante de medula óssea no útero mostraram resultados promissores.

Fontes do Artigo

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